Alienação e "O espancador", de Kafka

I

Queria escrever-te um poema
soprado assim no ouvido
um poema exclusivo teu
exclusivo deste momento
nós abraçados com a noite

um poema com extensão para ser épico
distante no tempo e no espaço
que narrasse guerras e amores

um poema todo ele
filtrado por seus cabelos
para ser ouvido e esquecido
lembrado apenas num verso
puro e cristalino
que reunisse e encerrasse
uma verdade insondável e inexplicável
um verso de potência poética
semente de poesia

fecundasse em sua mente
desse a mão a sua imaginação
seus sonhos e seus medos
suas mentiras e suas verdades

completasse essa ciranda
com o mais íntimo em ti

e dançasse com você toda

e de sua cabeça
esse verso caísse
em suas veias
e deitasse raízes
até seus pés
se espalhasse feito roseira
e te tomasse por inteira

queria escrever-te este poema

e ver você sorrir devagar

percebê-lo em sensação

no arrepio de tua pele

e te abraçar mais forte


II

aos teus pés 

queria te escrever um poema

com essas letras bem juntinhas

assim itálicas, meio caidinhas

debruçando-se em você